Se a política é a ferramenta de transformação da sociedade, imaginar é a possibilidade de construir novas realidades.

Imaginar é a ação ou a faculdade de pensar novas imagens e de criar novas realidades. Segundo o Dicionário Aulete, Imaginar é “a função mental que permite representar na mente seres, situações, cenários, objetos etc. com os quais não se teve uma experiência direta.”
Isso quer dizer que imaginar significa ir além da experiência real sobre um tema para plantear possibilidades de rompimento, que extrapolam as regras sociais ou os fatos como conhecemos, propondo transformações sociais através do resgate à imaginação política.
Levando essa mesma ideia para a política, a imaginação é capaz de projetar novas possibilidades de ação coletiva, muito diferentes daquelas ações institucionalizadas, que estamos acostumados, e que, por sua vez, já se provaram pouco diversas, bastante excludentes e nem um pouco representativas. Ao considerar a política como ferramenta de transformação da sociedade, a ação de imaginar a política é a possibilidade de construir novas realidades.
“Ficamos presos em duas grandes ideologias, ou sistemas, e paramos de imaginar a política, como é se relacionar socialmente de maneira saudável e diversa. Acho que a maneira como a gente faz isso é através dessa imaginação.”
Beatriz Dalla Costa, Cofundadora do Instituto Update
Por isso, quando falamos em imaginar a política, estamos tratando do princípio de pensar o espaço e o poder público, assim como a democracia, a partir de suas brechas, de suas possibilidades de transformação e de novos caminhos possíveis para um futuro melhor. Isso porque, se um sistema político não representa as pessoas e não opera pelo bem comum, o potencial de reformulá-lo está na ação de repensar as suas bases, o conjunto de crenças que sustenta esse formato de política – ou em outras palavras, o imaginário político. A ação de encontrar espaços de intervenção para pensar essas novas estruturas, nunca antes colocadas em prática, é a imaginação política.
“Nós somos seres que imaginam. Imaginamos que podemos ir à Lua e construímos um foguete. Imaginamos que podemos andar de carro e construímos o automóvel. Nós imaginamos e construímos. No exercício político, a gente não só pode como deve imaginar. ”
Túlio Malaspina, Cofundador do Instituto Update

Imaginar a política pode ser, por exemplo, pensar as possíveis mudanças estruturais em uma democracia onde 50% dos cargos políticos, em todas as instâncias do poder, passem a ser ocupados por mulheres. Isso é algo desconhecido no Brasil, mas trata-se de uma nova realidade possível. Nesse caso, que mudanças sociais esse novo paradigma pode trazer para a política e para todo o funcionamento da sociedade? O que muda quando mais mulheres ocupam a política?
Essas mudanças são maiores do que apenas uma adaptação institucional. Por isso, pensar na resposta para essa questão – e atuar na criação dessa nova realidade – é um exercício de imaginação política. No projeto Emergência Política Mulheres, que levou à produção do estudo e da websérie Eleitas, mostramos como a organização social e política feminina está revolucionando os formatos pré-concebidos da política institucional em toda a região latino-americana.
As periferias do Brasil, e de toda a América Latina, são territórios em que a imaginação política é vital para articular possibilidades de ação e de sobrevivência nos espaços negligenciados pelo Estado. No projeto Emergência Política Periferias mostramos como as forças políticas periféricas levam para a política institucional uma visão descentralizadora do poder – a política é uma obra coletiva ou não é coisa nenhuma.
Na América Latina, a tendência de criação de novas realidades a partir das rupturas é ainda mais forte. Isso porque esta é a região do mundo que menos confia na democracia e que está mais descontente com os seus governantes e com o sistema político. Ao mesmo tempo, é também a região mais desigual do mundo, onde o poder parece um instrumento inalcançável onde poucas pessoas perpetuam seus privilégios. Aqui e agora, esse descontentamento vem se mostrando um motor importante na busca por novas possibilidades de atuação através das brechas do poder, na busca pela inovação e na forma de se fazer política. Falamos sobre essas iniciativas e sobre as possibilidades de atuação transnacionais no projeto Emergência Política América Latina.
Inovação política na América Latina são novas práticas democráticas que reduzem as desigualdades e combatem a crise climática baseadas e garantindo equilíbrio na tomada de decisões
Imaginação política: como funciona na prática?
Por fim, vale ressaltar que a imaginação política não é algo único e centralizado, mas ações múltiplas e coletivas de criação de novas realidades para a política e a sociedade. Essas ações podem ser simbólicas, como o uso de bandanas verdes por mulheres argentinas, que deu origem a onda verde pela legalização do aborto em todo o mundo; ativistas,como os mandatos coletivos ou as iniciativas de ocupação populares, como a Casa Gabinetona ou o acampamento Luta pela Vida ; e também podem ser físicas, como a própria presença e atuação de mulheres negras e trans nos espaços do poder institucional historicamente masculinizados.
São múltiplas possibilidades de ação, diversas e inovadoras, que têm o potencial de recuperar a confiança da cidadania na democracia e de atualizar as práticas políticas de modo a construir um sistema que esteja realmente disposto a atuar na diminuição das desigualdades.
É preciso inovar nas práticas que estão impondo à sociedade um sistema de desimaginação política – marcado pela falta de participação, representação e pertencimento – e reconstruir um tecido coletivo de confiança mútua e ação democrática. Pensar essas possibilidades e colocá-las em ação é o princípio de tudo e o significado de imaginação política.
Bruno Palhanno é um jovem designer de uma pequena cidade no litoral de Santa Catarina.
Faz colagens surrealistas de um jeito único, inspirado por crítica social e sentimentos, pelo jeito que vê a vida, e a vida é arte.