Imaginar é a ação ou a faculdade de combinar ideias para criar novas realidades. É, em outras palavras, ir além, buscar mais, avançar, ampliar, mudar para melhor.
A imaginação, portanto, consiste em um ingrediente fundamental à política – especialmente em países que, como o Brasil, são marcados por profundas desigualdades sociais e políticas. É imaginando que podemos idealizar, propor e colocar em prática caminhos que vão transformar a realidade e promover uma sociedade mais justa, democrática e igualitária.
É pela imaginação política que, ao pensar e projetar novas possibilidades de ação coletiva, uma sociedade se desenvolve. Como resume Beatriz Della Costa, cofundadora e codiretora do Instituto Update, “a imaginação política é fundamental para construir realidades e organizar o futuro”. E imaginar o nosso próprio futuro, para além do que está dado e estabelecido, é, mais do que um direito, uma necessidade.
Nos últimos quatro anos, durante o governo Bolsonaro, vivemos imensos retrocessos, mas isso não significa que o Brasil tenha parado de imaginar futuros melhores. Embora a imaginação tenha se mantido mais ausente do que nunca do centro no poder, ela nunca deixou de comer pelas beiradas, fervilhando e buscando saídas nas margens e periferias por meio da criatividade e da colaboração de ativistas, da sociedade civil e de muitos políticos de oposição.
Agora, no novo governo, embora os desafios pela frente ainda sejam inúmeros e complexos, essas novas maneiras de fazer política estão enfim se institucionalizando.
No dia 1 de janeiro de 2023, a imaginação política literalmente subiu a rampa do Palácio do Planalto. Porque, como ninguém é capaz de esquecer, Lula chegou para tomar posse acompanhado de oito representantes da sociedade – e, como nunca na política brasileira, esses representantes de fato carregavam em si a representatividade. Entre eles estavam o cacique Raoni, importante liderança indígena, a catadora Aline Sousa e o ativista na luta das pessoas com deficiência Ivan Baron.

A subida da rampa é um ritual carregado de significados e simbolismos, refletindo, mais do que a continuidade e a estabilidade institucionais, a afirmação da própria democracia. Um Brasil em que a sociedade sobe a rampa, portanto, é um Brasil que tem enfim a possibilidade de dar asas à imaginação política.
E essa imaginação já começou a se transformar em ação concreta com o anúncio dos ministérios. Nunca houve tantas mulheres, pessoas negras e indígenas nas pastas do governo – embora, claro, sempre possa haver mais. Outra nomeação emblemática foi a de Joenia Wapichana para presidência da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), responsável pela proteção e promoção dos direitos das diferentes etnias do país. Em 55 anos, é a primeira vez que uma pessoa indígena está à frente do órgão.

Essa diversidade de representatividade e de poder é fundamental para pensar e articular as necessidades e demandas de todos os setores da sociedade. O fortalecimento da democracia, afinal, se dá acima de tudo a partir da participação ativa dos diversos atores e atrizes que a compõem.
A imaginação política também foi semeada com o anúncio pelo presidente Lula, em março, do pacote com sete medidas para a igualdade racial no Brasil, que vai atuar na promoção dos direitos da população quilombola – cerca de 214 mil famílias e mais de 1 milhão de pessoas – nos eixos de acesso à terra, infraestrutura e qualidade de vida, inclusão produtiva e desenvolvimento local, direitos e cidadania. Trata-se de uma iniciativa essencial para combater o racismo estrutural que ainda permeia a nossa sociedade brasileira.
De certa forma, imaginação política é sonho – ou, mais do que isso, é agir para transformar sonhos coletivos em realidade. Nesse sentido, na essência, foi de imaginação política que, fazendo referência a Martin Luther King, Silvio Almeida falou em seu discurso de posse como ministro Ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania: “Eu também tenho um sonho. E quero sonhá-lo com todo o povo brasileiro. Eu sonho com um futuro no qual nós já vencemos. Nós somos a vitória dos nossos ancestrais. Nós somos a vitória, também, daqueles que virão depois de nós.”
No discurso, o ministro celebrou as populações minorizadas: “Vocês existem e são valiosos para nós”, disse. Com essa fala, ele reconhece que, mais do que representatividade, é importante dar espaço. Para que a imaginação política aconteça na prática, todas as pessoas precisam se tornar visíveis para o Estado. E um Estado que tem a imaginação no centro do seu fazer político é um Estado que tem nos espaços de poder representantes dos grupos vítimas de injustiças e opressões.
Como lembra Tulio Malaspina, cofundador e codiretor do Instituto Update, “nós somos seres que imaginam. Imaginamos que podemos ir à Lua e construímos um foguete. Imaginamos que podemos andar de carro e construímos o automóvel. Nós imaginamos e construímos. No exercício político, a gente não só pode como deve imaginar.”
Agora temos que, juntos, imaginar o Brasil que queremos e precisamos – hoje, em 2026 e além.