“Precisamos de mulheres no poder – e com poder – para transformar a vida de todas as mulheres”. Essa frase, da ex-deputada federal mexicana Martha Tagle, explicita, em poucas palavras, a importância prática da paridade de gênero da política. As mulheres, que são metade da população, precisam estar no poder nessa mesma proporção para que seus direitos sejam assegurados.
Diversos países têm avançado nesse ponto. Em muitos aspectos, a América Latina vem liderando esse processo. No México há, desde 2018, paridade obrigatória no Congresso e, a partir do ano seguinte, também nos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e nos órgãos federais, estaduais, municipais e autônomos. Já o Chile realizou, entre 2021 e 2022, a primeira Convenção Constitucional do mundo composta em igual número por homens e mulheres – embora, infelizmente, a Constituição dali originada tenha sido rejeitada em plebiscito. A Colômbia, por sua vez, aprovou, em 2020, a paridade de gênero em listas eleitorais.
O Brasil, no entanto, não tem acompanhado o passo dos vizinhos. Segundo dados do Observatório da Igualdade de Gênero da América Latina e do Caribe, ligado à ONU, somos um dos países com a menor representatividade feminina na política em toda a América Latina, na frente apenas de Belize e do Haiti. Como mudar esse quadro? O que podemos aprender com as diferentes experiências sobre a busca pela igualdade de gênero na política? Como podemos avançar juntas?
Para responder a essas perguntas – e enfim começarmos a avançar –, o Instituto Update realizou, em parceria com a Fundação Friedrich-Ebert-Stiftung (FES) Chile, o evento La Mitad, que reuniu em São Paulo dezoito convidadas de quatro países latino-americanos: Brasil, Chile, Colômbia e México. A proposta foi proporcionar a troca de visões e aprendizados sobre o conceito de paridade a partir de diferentes linhas e cenários culturais, disseminando exemplos e práticas inovadoras que marcaram processos conjuntos na América Latina.

#MulheresDeAaZ
A primeira mesa contou com as presenças internacionais da ex-constituinte chilena Giovana Roa, da já mencionada ex-deputada mexicana Martha Tagle e de Juliana Hernández, diretora da Fundação Artemisas, que se juntaram às brasileiras Marina Barros, diretora do Instituto Alziras, e Beatriz Della Costa, diretora e cofundadora do Instituto Update, para uma conversa sobre as trajetórias de mobilização que levaram à paridade em seus países e os caminhos que podem ser trilhados pelo Brasil.
Depois, Monica Oliveira, da Rede de Mulheres Negras de Pernambuco, Bárbara Sepúlveda, também ex-constituinte chilena, María del Mar Pizarro, congressista colombiana, e Tainara Faria, vereadora brasileira, abordaram, na segunda mesa, com mediação da pesquisadora Débora Thomé, do +Representatividade, o papel dos diferentes entes e instâncias nas discussões sobre a paridade e os incentivos à participação política.
No segundo dia do encontro, Manuela Royo, ex-constituinte chilena, Irma Juan Carlos, deputada mexicana, e Manuela D’ávila, ex-deputada brasileira, mediadas pela mexicana Alejandra Parra, gerente do programa de formação do Instituto Update, debateram a relação da paridade com a sociedade civil e as alianças transversais entre mulheres.
Para encerrar o evento, um papo entre jornalistas: a brasileira Giulliana Bianconi, editora do site Gênero e Número, a chilena Belén Pellegrini, ex-diretora do site La Neta, e a colombiana Catalina Ruiz-Navarro, diretora da revista Volcánicas, abordaram experiências de projetos de imprensa feministas e discutiram, com mediação da brasileira Carol Pires, como essas iniciativas podem contribuir para uma mudança legal e cultural que possa contribuir para a entrada de mais mulheres na política.
As conversas foram múltiplas e inspiradoras, abordando os mais diversos aspectos e possibilidades da busca pela paridade de gênero, mas não deixaram dúvidas de que, na prática, isso é algo que vai muito além da aprovação de uma lei. A participação de toda a sociedade é crucial para a construção de uma imaginação política de mais mulheres no poder. O envolvimento da população precisa ser buscado por meio de mensagens diretas, afetivas e individualizadas, abordando a paridade de gênero como um modelo que deseja, acima de tudo, construir uma democracia sólida para todos: afinal, não há democracia sem representatividade. Se somos metade da população, precisamos, sim, ser a metade da política – a metade das pessoas que decidem por todas as outras.
La Mitad foi realizado entre os dias 21 e 22 de novembro de 2022 na Livraria Gato Sem Rabo, especializada em livros de mulheres, transexuais e travestis. O evento marcou o encerramento do projeto Nuestras Cartas, iniciativa do Instituto Updade e da FES Chile que documentou o trabalho das mulheres eleitas para a Convenção Constitucional chilena.